sábado, 16 de abril de 2011

Sobre o prefácio da Fundamentação da Metafísica dos Costumes


A busca por um princípio moral que orientasse a conduta dos homens habitava o pensamento de antigos e medievais, estes através da religião cristã que se queria universal, e, portanto, fundadora de uma moral que deveria se estender a todos os homens e aqueles através da idéia do Bem e da virtude. E até mesmo o senso comum quando julga ações ou pessoas pressupõe a universalidade de seu julgamento. A “idéia comum do dever e das leis morais” (389) manifestam a necessidade de um princípio seguro que prescinda de toda a experiência e que oriente a conduta dos homens de maneira universal.

Visto que, para Kant, um saber só se configura como universal e necessário quando está embasado na razão pura, ele inicia o prefácio da GM dando sua contribuição para a já estabelecida divisão da filosofia em Lógica, Física e Ética, para assim, demarcar os limites de nosso conhecimento e demonstrar a necessidade de uma metafísica dos costumes. Ele separa o conhecimento racional pelo seu objeto. Assim, temos:

· Conhecimento racional formal: Como o próprio nome diz o conhecimento formal, da qual a lógica é a representante, se ocupa da forma e das leis do pensamento, de modo que abstrai todo objeto particular ou conteúdo do pensamento.

· Conhecimento racional material: A Física e a Ética se enquadram nesta subdivisão, pois ambas investigam os objetos da natureza e as leis que os governam, os quais estão no tempo e no espaço e, por isso, são fenômenos ou objetos da experiência. Tratando-se das leis naturais, o conhecimento racional chama-se filosofia natural e, por outro lado, referindo-se às leis da liberdade denomina-se filosofia dos costumes. A filosofia natural se ocupa das leis segundo as quais tudo acontece, entretanto a filosofia dos costumes se debruça sobre leis de acordo com as quais tudo deve acontecer.

Kant divide a filosofia em dois grandes campos que insiste em manter separados: filosofia empírica e filosofia pura.

· Empírica: Se sustenta em princípios da experiência.

· Pura: deriva-se de princípios que residem a priori. Se for simplesmente formal recebe o nome de lógica, porém, dá-se o nome de Metafísica se ferir-se a objetos do entendimento. Ou seja, a física e a ética quando forem puras são chamadas respectivamente de Metafísica da natureza e Metafísica dos costumes.

As críticas aos pensadores que misturaram a parte pura com a empírica são ferrenhas. Ao longo de toda a GM Kant retornará a sua preocupação de manter separados os dois tipos de filosofia. A história mostrou que as abordagens que não consideraram essa separação não conseguiram atingir seus objetivos de acordo com as exigências de necessidade e universalidade que a razão impõe. Só uma lei que se estribe em princípios a priori pode ter em si uma “absoluta necessidade” (389). Os costumes dos povos são diferentes, cada um tem suas particularidades, mas isso cabe a Antropologia prática e não à Metafísica dos costumes. Kant não está preocupado com o campo do contingente neste caso. O que urge para ele é fundamentar um princípio supremo da moralidade, segundo o qual todos os homens em todas as culturas e épocas possam se orientar.

Assim, Kant adverte que a busca por esse princípio não é necessária apenas especulativamente, mas que seu propósito se estende a sua aplicação no agir do homens que se encontram desprovidos de um princípio regulador de sua conduta moral. A ausência dessa orientação segura leva os homens ao erro, pois embora ajam muitas vezes de conformidade com a lei moral, também erram na mesma proporção. E ainda é mais fácil afirmar isso sabendo que o homem é facilmente levado a agir instintivamente. Portanto, regras práticas não são seguras para fundamentar o agir dos homens, fato que mostra que só uma metafísica dos costumes é capaz de suprir essa necessidade de orientação moral. Em todas as épocas os filósofos buscaram esse princípio supremo da moralidade, mas não com os critérios de aprioridade, necessidade e universalidade.

REFERÊNCIA

KANT, I. Fundamentação da Metafísica dos Costumes. São Paulo: Editora Abril, Col. Os

Pensadores, 1973.

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